sábado, dezembro 30, 2017

IMAGINÁRiO #432

José de Matos-Cruz | 24 Agosto 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

DESVENTURAS
Após um cataclismo em 2012, o nosso planeta viveu sem sobressaltos durante quase cem anos, defendido por uma original e poderosa tropa de elite. Até que três asteróides, de origem desconhecida, rumam em direcção à Terra, e os estóicos defensores tudo tentam para evitar uma destruição… Assim sagra O Início de Asteroid Fighters, com edição em 2009 sob chancela Asa. Entre os jovens autores portugueses de banda desenhada, talentosos e inspirados, Rui Lacas - distinguido com o Prémio do Melhor Argumento no Festival de Les Moulins, por Merci Patron /Obrigada, Patrão (2006) - regressa com Os Oráculos, em que os Asteroid Fighters enfrentam nova e inesperada ameaça. Um asteróide artificial, lançado de base lunar secreta, cuja substância explosiva visa precipitar uma colossal vingança… Heróica e vibrante, irónica e trepidante, a saga de Asteroid Fighters prosseguirá com Guerra - consumando o estilo visual e vigoroso de Rui Lacas, em que a aventura e o fantástico se conjugam numa recriação lúdica e sarcástica.
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MEMÓRiA

11FEV1903-1942 - Irène Némirowsky: Escritora judia, de origem russa/ucraniana - «É bem certo que eu teria adoçado muito David Golder (1929), se já houvesse Hitler, e não lhe teria dado o mesmo sentido. Mas seria um erro, teria mostrado franqueza indigna de um verdadeiro escritor».

1909-24AGO1943 - Simone Weil: Escritora, mística e filósofa francesa - «O mal não é sofrimento nem pecado; ele é ambos ao mesmo tempo, ele é algo comum a ambos. Pois eles estão visceralmente ligados; o pecado faz-nos sofrer e o sofrimento torna-nos maus, e este complexo indissolúvel de sofrimento e pecado é o mal - no qual submergimos contra nossa vontade, e para nosso horror». IMAG.82-213

25AGO1923-2005 - Fernando Távora: Arquitecto português, precursor da Escola do Porto, mestre de Álvaro Siza Vieira - «Trabalha e molda a pré-existência, usa-a como matéria de projecto. Relê nela o fluir da História e, aceitando sobreposições ou aposições estilísticas ou de linguagem, usa de todos os meios para o clarificar. Não prescindindo da investigação histórica e arqueológica, anota fases de desenvolvimento, dando-lhes sem moralismo, uma nova dignidade» (Alexandre Alves Costa - excerto). IMAG.56

26AGO1743-1794 - Antoine Laurent de Lavoisier: Cientista francês - «Da palavra deve nascer a ideia, a ideia deve ater-se ao facto» (Tratado Elementar de Química). IMAG.342

1907-29AGO1983 - António Cruz: Artista plástico português - «De todos os pintores do Porto do Século XX, foi decerto aquele que melhor soube entender a alma da cidade» (Bernardo Pinto de Almeida).

31AGO1913-2009 - Helen Levitt: Fotógrafa americana, uma das mais importantes do Século XX, famosa pelos instantâneos de rua em Nova Iorque. IMAG.243

1882-31AGO1963 - Georges Braque: Escultor e pintor francês, pioneiro do cubismo - «Amo a regra que corrige a emoção. Amo a emoção que corrige a regra».

1894-31AGO1973 - John Ford: Cineasta americano - «Quando a lenda for mais interessante do que a realidade, imprima-se a lenda!» (O Homem Que Matou Liberty Valance – 1962).
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CALENDÁRiO

1952-17OUT2012 - Sylvia Kristel: Modelo e actriz holandesa, protagonista de Emmanuelle (1974) - «Eu era uma actriz muda, um corpo. Pertencia aos sonhos, aqueles que não se podem destruir» (Nua - 2006).

22-27OUT2012 - No Centro Cultural de Belém, decorre o Ciclo CCB No CCB - Camilo Castelo Branco No Centro Cultural de Belém, incluindo exposições, músicas, conferências, conversas e filmes, sob o tema Camilo Castelo Branco [1825-1890] - As Paixões Juvenis e o ‘Amor de Perdição’.
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26OUT-30DEZ2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe Entre o Que Vejo e o Que Sou de Isabel Mourão.

26OUT2012 - ZON Audiovisuais estreia 007 - Skyfall de Sam Mendes; sobre a saga heróica de James Bond, concebida por Ian Fleming (1908-1964), com Daniel Craig e Bénérice Marlohe.
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VISTORiA

António Cruz

Ouve-se um silvo distante, que arrepia a água. Não há dúvida, a noite vai cair. Uma noite antiga, de há cinquenta anos, onde ninguém poderá pressentir a desgrenhada noite dos nossos dias, ruidosa, insegura, desumana. Olhadas assim, com olhos fatigados, as aguarelas de que estivemos a falar escorrem, também elas, melancolia.
Eugénio de Andrade
- António Cruz, O Pintor e a Cidade (1997)

ANTIQUÁRiO


1956 - Manoel de Oliveira produz e realiza O Pintor e a Cidade - Os aspectos mais característicos do Porto (arquitectura, ambiente, vida quotidiana, passado, presente e futuro), em visão pelo prisma estético de António Cruz. Assim, as imagens reais alternam com as impressões que o artista plástico vai registando, nas suas aguarelas... O pintor sai do atelier e percorre a cidade.

PARLATÓRiO

A verdade existe. Apenas se inventa a mentira. / Quando se apela ao talento, é porque falta a imaginação. / Para mim, o acto de pintar é sempre mais importante do que a coisa pintada. / Temos de nos contentar em descobrir, abstendo-nos de explicar. / O quadro está acabado quando apagou a ideia que o motivou. / Não se pode pedir ao artista mais do que ele pode dar, nem ao crítico mais do que ele pode ver.
Georges Braque

Digo-lhes hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades e frustrações do momento, ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.
Tenho um sonho que um dia esta nação levantar-se-á e viverá o verdadeiro significado da sua crença: «Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais».
Tenho um sonho que um dia nas montanhas rubras da Geórgia os filhos de antigos escravos e os filhos de antigos proprietários de escravos poderão sentar-se à mesa da fraternidade.
Tenho um sonho que um dia o estado do Mississipi, um estado deserto, sufocado pelo calor da injustiça e da opressão, será transformado num oásis de liberdade e justiça.
Tenho um sonho que meus quatro pequenos filhos viverão um dia numa nação onde não serão julgados pela cor da sua pele, mas pela qualidade do seu carácter.
Tenho um sonho, hoje!
Martin Luther King Jr.
(1929-1968) na capital dos EUA, em 28AGO1963, após a Marcha Sobre Washington (excerto)
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INVENTÁRiO

Vigésima terceira longa metragem da saga fílmica de James Bond, com realização de Sam Mendes a cargo de Eon Productions. Daniel Craig volta como protagonista.
Sendo argumentistas Neal Purvis, Robert Wade e Josh Logan, a lealdade do agente com ordem para matar, em relação à sua chefe (Judi Dench), é posta à prova, quando o passado de M volta a assombrá-la. Com o MI6 vulnerável, 007 deve investigar e destruir a ameaça, personificada pelo terrível Raoul Silva (Javier Bardem).


BREVIÁRiO

Sistema Solar edita David Golder de Irène Némirowsky (1903-1942); tradução de Aníbal Fernandes.

Harmonia Mundi edita em CD, Ludwig van Beethoven [1770-1827]: Complete Piano Trios por Trio Wanderer.
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Parceria A.M. Pereira edita O Homem Que Sonhou de Tomaz de Figueiredo (1902-1970). IMAG.272

Presença edita Lisboa - A Guerra Nas Sombras da Cidade da Luz, 1939-1945 de Neill Lochery.

Sony Classical edita em CD, Glenn Gould [1932-1982]: [Johann Sebastian] Bach [1685-1750] - The Goldberg Variations 1955.
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EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS - Folhetim Aperiódico

COMO GUARDAR O CORAÇÃO NA CAIXINHA DAS ESMOLAS - 4

Ante tamanha boçalidade, até a imaginação grotesca de Cândido Roubeta se apavorou. Não era dado ao temor místico, mas um abalo desde as partes genitais fê-lo, ainda, duvidar num arrebato da masculinidade:
- E se, mais tarde, ele aparece em fantasma? Carago, Benedita, nisso não se pode tocar nem espairecer...
- Mas interessa-te pôr a unha na bolsa do dinheiro dele, não é?
Continua

sexta-feira, dezembro 29, 2017

IMAGINÁRiO #431

José de Matos-Cruz | 16 Agosto 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

DELÍRIOS
Pelos anos ’70 do Século XX, Terry Gilliam tornou-se notado como artista de quadradinhos - em Nova Iorque, ao trabalhar com Harvey (Mad) Kurtzmann, em Help!; e em França, como colaborador da Pilote pela mão de René (Astérix) Goscinny. Um salto a Inglaterra comprometeu-o na série televisiva Monty Python’s (1969), graças à associação com (outro) Terry (de apelido) Jones. Mais tarde, esta equipa de magos visionários e sarcásticos transitou para o cinema - em títulos como Monty Python e o Cálice Sagrado (1975) ou O Sentido da Vida (1983), onde se contrastam uma extravagância por vezes surrealista, e filosóficas considerações sobre a civilização tecnológica, paralelamente a reflexos de paroxismo ou elementar humor… Argumentista, actor eventual, mestre da animação, Terry Gilliam evocaria: «Todos os meus filmes dessa época tiveram origem em mim, desenvolvendo ideias próprias e insistindo na sua concretização. Em contraste com os privilégios do director no cinema americano, eu via-me como um autêntico realizador!»

CALENDÁRiO

1925-05OUT2012 - Claude Pinoteau: Cineasta francês, produtor e realizador de A Bofetada / La Gifle (1974).

1957-05OUT2012 - Bruno Le Floc’h: Ilustrador e criador de animação, artista de banda desenhada, distinguido com o Prémio Goscinny ao Argumentista por Trois Éclats Blancs (2004).

10OUT2012 - O cineasta Carlos Saura é distinguido com o Prémio Luso-Espanhol de Arte e Cultura 2012, pela realização de Fados (2007). IMAG.93-166-172-331

11OUT2012 - ZON Audiovisuais estreia O Gebo e a Sombra de Manoel de Oliveira; sobre a peça de Raul Brandão (1867-1930), com Michael Lonsdale e Claudia Cardinale.
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10-30OUT2012 - Em Lisboa, Galeria de Arte do CDL / Ordem dos Advogados / Conselho Distrital de Lisboa expõe Utopias, escultura e pintura de Dário Vidal. IMAG.388

11OUT2012 - Mo Yan é distinguido com o Prémio Nobel da Literatura, porque «com um realismo alucinatório, funde contos populares, história e contemporaneidade».

18OUT2012 - ZON Audiovisuais estreia Astérix e Obélix ao Serviço de Sua Majestade / Astérix et Obélix au Service de Sa Majesté de Laurent Tirard; sobre a saga em quadradinhos de René Goscinny & Albert Uderzo, com Edouard Baer e Gérard Depardieu.
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19OUT2012 - Em Lisboa, Livraria Leya na Buchholz apresenta Cinzas da Revolta - exposição de banda desenhada por Miguel Peres e Jhion / João Amaral, com álbum editado sob chancela Asa, por ocasião do 23º Festival AmadoraBd. IMAG.7-149-155-204-416-430

20OUT2012-17MAR2013 - Em Lisboa, Museu da Electricidade apresenta Riso - em pintura, fotografia, cinema, teatro, ópera e literatura, sendo comissários José Manuel Fernandes, João Pinharanda e Nuno Artur Silva.

MEMÓRiA

1907-05FEV1973 - António Jorge Dias: Etnólogo e antropólogo português - «É um povo paradoxal e difícil de governar. Os seus defeitos podem ser as suas virtudes, e as suas virtudes os seus defeitos, conforme a égide do momento» (Os Elementos Fundamentais da Cultura Portuguesa - 1953).

15JUL1933-31JUL2003 - Guido Crepax: Artista italiano de banda desenhada, argumentista e ilustrador, criador de Valentina (1965) - «Agrada-me o jogo da vida dupla, o mundo da fantasia onde qualquer coisa pode acontecer. A beleza da fantasia não seria o que é, se não existisse o outro lado da moeda, a realidade». IMAG.40-400

17AGO1893-03ABR1933 - Wilson Mizner: Ficcionista e dramaturgo americano - «Quando se rouba de um autor, diz-se que é plágio; quando se rouba de muitos, passa a ser pesquisa».

19AGO1883-1971 - Coco Chanel: Estilista francesa - «Para sermos insubstituíveis, temos que ser diferentes… A cor mais chique do mundo é a que nos fica melhor». IMAG.306

PARLATÓRiO

Adoro o luxo… E o luxo não reside na riqueza ou na ostentação, mas na falta de vulgaridade.
Coco Chanel

Guido Crepax é um homem de sucesso, o primeiro que teve a capacidade de trazer para o mundo dos quadradinhos, italiano e internacional, algo de novo: um novo estilo gráfico, importante e incisivo. A sua forma de narrar tornou-se uma novidade, e diria que foi o primeiro a não dirigir-se a um público infantil, e sim a adolescentes e adultos.
Hugo Pratt

Agora, volto à saga de Valentina e comprovo que, convertida já num clássico da expressão gráfica contemporânea, nem por isso perdeu um ápice da sua sã capacidade transgressora e iconoclasta… Valentina converteu-se, pois, num evento fundamental, para a história da banda desenhada culta e europeia.
Román Gubern (1981)



BREVIÁRiO

Sony Pictures edita em Blu-ray, Monty Python e o Cálice Sagrado / Monty Python and the Holy Grail (1975) de Terry Jones e Terry Gilliam; com Graham Chapman e John Cleese. IMAG.8-62-166-384-419

Relógio d’Água edita Música de Câmara de James Joyce (1882-1941); tradução de João Almeida Flor. IMAG.136-306-357-404

Harmonia Mundi edita em CD, Wolfgang Amadeus Mozart [1756-1791]: Keyboard Music, Vol. 3 pelo pianista Kristian Bezuidenhout.
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Quetzal edita Memorial do Coração - Conversa a Quatro Mãos de António Manuel Couto Viana (1923-2010) e Ricardo de Saavedra. IMAG.107-308-332-403

Deutsche Grammophon edita em CD, Ludwig van Beethoven [1770-1827] - Sinfonia Nº 3 - Eroica por Orquestra Sinfonica Juvenil Simón Bolívar, sob a direcção de Gustavo Dudamel.
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VISTORiA

Caracterização Psicológica Do Povo Português

O Português é um misto de sonhador e de homem de acção, ou melhor, é um sonhador activo, a que não falta certo fundo prático e realista. A actividade portuguesa não tem raízes na vontade fria, mas alimenta-se da imaginação, do sonho, porque o Português é mais idealista, emotivo e imaginativo do que homem de reflexão. Compartilha com o Espanhol o desprezo fidalgo pelo interesse mesquinho, pelo utilitarismo puro e pelo conforto, assim como o gosto paradoxal pela ostentação de riqueza e pelo luxo. Mas não tem, como aquele, um forte ideal abstracto, nem acentuada tendência mística. O Português é, sobretudo, profundamente humano, sensível, amoroso e bondoso, sem ser fraco. Não gosta de fazer sofrer e evita conflitos, mas, ferido no seu orgulho, pode ser violento e cruel. A religiosidade apresenta o mesmo fundo humano peculiar ao Português. Não tem o carácter abstracto, místico ou trágico próprio da espanhola, mas possui uma forte crença no milagre e nas soluções milagrosas.
Há no Português uma enorme capacidade de adaptação a todas as coisas, ideias e seres, sem que isso implique perda de carácter. Foi esta faceta que lhe permitiu manter sempre a atitude de tolerância e que imprimiu à colonização portuguesa um carácter especial inconfundível: a assimilação por adaptação.
O Português tem um vivo sentimento da Natureza e um fundo poético e contemplativo estático diferente dos outros povos latinos. Falta-lhe também a exuberância e a alegria espontânea e ruidosa dos povos mediterrâneos. É mais inibido que os outros meridionais pelo grande sentimento do ridículo e medo da opinião alheia. É, como os Espanhóis, fortemente individualista, mas possui grande fundo de solidariedade humana. O Português não tem muito humor, mas um forte espírito crítico e trocista e uma ironia pungente.
Jorge Dias
(1950 - excerto)

A minha história começa no dia 1 de Janeiro de 1950. Nos dois anos anteriores, nas profundezas do inferno, eu tinha sofrido torturas cruéis que nenhum ser humano seria capaz de conceber. Sempre que era trazido ao tribunal, proclamava a minha inocência em tons solenes, comoventes, tristes, desgraçados, que penetravam cada greta do Salão de Audiência do Senhor Yama, e se repercutiam em muitas camadas de ecos. Nem uma palavra de arrependimento saiu dos meus lábios, embora eu fosse torturado cruelmente, o que me valeu a reputação de homem de ferro. Sei que ganhei o respeito silencioso de muitos dos funcionários do submundo de Yama, mas sei também que o Senhor Yama não me suportava mais. Assim, para me obrigar a admitir a derrota, submeteram-me à mais sinistra forma de tortura que o inferno tem no seu stock: atiraram-me para uma tina de óleo fervente, na qual eu rolei, contorci-me e gemi como um frango frito durante cerca de uma hora. Palavras não têm como fazer justiça à agonia que senti, até que um servente me espetou com um tridente e, carregando-me bem alto, me conduziu à escadaria do palácio. Juntaram-se a ele dois outros serviçais, um de cada lado, que guinchavam como morcegos-vampiros todas as vezes que o óleo escaldante pingava do meu corpo nos degraus do Salão de Audiência, produzindo borrifos e pequenas nuvens de fumaça amarela. Com cuidado, depositaram-me numa laje aos pés do trono e fizeram uma profunda mesura.
Mo Yan
- Life and Death Are Wearing Me Out (2006 - excerto
- Tradução de Howard Goldblatt - Sobre Versão de Sérgio Rodrigues)

quinta-feira, dezembro 28, 2017

IMAGINÁRiO #430

José de Matos-Cruz | 08 Agosto 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

EXALTAÇÃO
Pintor emérito, e um dos maiores artistas europeus de quadradinhos - pela sensibilidade poética e exaltante do seu imaginário, pela emoção épica e telúrica da sua narrativa, pelo arrebato humano, pelo paroxismo natural, pelo deslumbre paisagista, pela ilustração romanesca - Franco Caprioli (1912-1974) tem uma notável e exaustiva sagração analítica por Jorge Magalhães, No Centenário do Desenhador Poeta, com edição da Câmara Municipal de Moura.
«Ao fazer-se um exame crítico e estético da vasta obra que Caprioli legou à posteridade não é possível esquecer o seu estilo inconfundível. O “pontilhismo”, com efeitos gráficos surpreendentes, era uma técnica absolutamente pessoal, que ele aliava ao equilíbrio da forma, ao rigor anatómico e documental, à expressividade dos grandes planos e à noção de perspectiva» - evoca o nosso autor e admirador, que apresenta ainda um vasto e deslumbrante manancial icónico e figurativo. Afinal, consumando o próprio testemunho ético e memorial do mestre italiano: «Sempre procurei representar o mundo como gostaria que ele fosse, e o coração e a alma dos homens como seriam se todos pudessem confiar uns nos outros e viver em paz e harmonia».
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CALENDÁRIO

26OUT-11NOV2012 - No 23º Festival Internacional de Banda Desenhada - Amadora Bd 2012, Fórum Luís de Camões expõe O Infante Portugal Em Universos Reunidos - sobre a trilogia escrita por José de Matos-Cruz, e a transição para banda desenhada com Daniel Maia; mostra retrospectiva de Isabel Aboim, Filipe Abranches, Renato Abreu, Teotónio Agostinho, João Amaral, Ana Biscaia, Cação Biscaia, Ricardo Cabral, Richard Câmara, Diniz Conefrey, João David, Luís Diferr, José Carlos Fernandes, Fernando Filipe, Sara Franco, José Garcês, António Jorge Gonçalves, Daniel Henriques, Catherine Labey, Rui Lacas, João Vasco Leal, Luís Louro, Daniel Maia, Zé Manel, J. Mascarenhas, Pedro Massano, Baptista Mendes, Fernando Vilhena de Mendonça, Victor Mesquita, Susa Monteiro, Nuno Pereira, Susana Resende, Miguel Rocha, André Ruivo, José Ruy, Eugénio Silva, Augusto Trigo, Maria João Worm e Carlos “Zíngaro”.

1917-01OUT2012 - Eric John Ernest Hobsbawm, aliás Eric Hobsbawm: Historiador britânico de orientação marxista, nascido em Alexandria, autor de Tempos Interessantes - Uma Vida No Século XX - «Pertenço a uma geração para a qual a Revolução de Outubro representava a esperança do mundo».

04OUT2012 - Clap Filmes produziu, e estreia Linhas de Wellington de Valeria Sarmiento; com John Malkovich e Victoria Guerra. IMAG.357

04OUT2012 - Vende-se Filmes produziu, e estreia Orquestra Geração de Filipa Reis e João Miller Guerra; com Diogo Dias e Ana Hespanha.

1942-06OUT2012 - Antonio Cisneros: Ficcionista e poeta peruano - «No era maná del cielo pero había comida para todos y amor de Dios.» (En Las Tierras Más Verdes).

VISTORiA

Todos por Um

A manhã está tão triste
que os poetas românticos de Lisboa
morreram todos com certeza.

Santos
Mártires
e Heróis.

Que mau tempo estará a fazer no Porto?
Manhã triste, pela certa.

Oxalá que os poetas românticos do Porto
sejam compreensivos a pontos de deixarem
uma nesgazinha de cemitério florido
que é para os poetas românticos de Lisboa não terem de
recorrer à vala comum.
Mário Cesariny de Vasconcellos

VISTORiA

Canção do Exílio

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas tem mais flores,
Nossos bosques tem mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Gonçalves Dias

MEMÓRiA

09AGO1923-2006 - Mário Cesariny de Vasconcellos: Poeta e pintor português, ligado ao surrealismo - «Passa os olhos pelo lenço. Acabou-se. / Vai sair. Talvez vá jantar? /É inverno. Lá fora, faz frio.» (Rua do Ouro - excerto). IMAG.17-19-20-29-66-123-179

09AGO1963-2012 - Whitney Houston: Cantora americana de pop, gospel e soul - «Quando decidi dedicar-me a esta actividade artística, a minha mãe avisou-me de que acabaria por estar sozinha. Mas, basicamente, todos nós estamos. A solidão vem com a vida». IMAG.395

10AGO1823-1864 - Gonçalves Dias: Poeta e teatrólogo brasileiro - «Enfim te vejo! - enfim posso, / Curvado a teus pés, dizer-te, / Que não cessei de querer-te, / Pesar de quanto sofri. / Muito penei! Cruas ânsias, / Dos teus olhos afastado, / Houveram-me acabrunhado / A não lembrar-me de ti!» (Ainda Uma Vez - Adeus - excerto).

15AGO1933-2009 - Mike Seeger: Compositor e músico americano de folk - «Gravou e ajudou a produzir dezenas de álbuns daquilo a que chamava a verdadeira música americana, uma mistura das tradições britânica e africana com o jeito de contar histórias com raízes no sul» (The New York Times). IMAG.265

ANUÁRiO

1863 - Neste ano, segundo o Relatório Geral do Serviço da Repartição de Saúde, são expostas - nas igrejas e em diversas localidades de Lisboa - 366 crianças mortas.

ANTIQUÁRiO

05SET2008 - Em Paris, Théâtre Montparnasse estreia Le Diable Rouge, de Antoine Rault; durante o reinado (1643-1715) de Luís XIV, encenação de Cristophe Lidon.



CONTRADITÓRiO

Colbert: - Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço...
Mazarino: - Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar à prisão. Mas o Estado... é diferente!!! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem!
Colbert: - Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criámos todos os impostos imagináveis?
Mazarino: - Criando outros.
Colbert: - Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.
Mazarino: - Sim, é impossível.
Colbert: - E sobre os ricos?
Mazarino: - Os ricos também não. Eles deixariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres.
Colbert: - Então, como faremos?
Mazarino: - Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer, e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média!
Antoine Rault
- Le Diable Rouge

COMENTÁRiO

Os Primeiros Cantos são um belo livro; são inspirações de um grande poeta. A terra de Santa Cruz, que já conta outros no seu seio, pode abençoar mais um ilustre filho. O autor, não o conhecemos; mas deve ser muito jovem. Tem os defeitos dos escritos ainda pouco amestrados pela experiência: imperfeições de língua, de metrificação, de estilo. Que importa? O tempo apagará essas máculas, e ficarão as nobres inspirações estampadas nas páginas deste formoso livro.
Alexandre Herculano
1847-1848 - Revista Universal Lisbonense

BREVIÁRiO

Sony edita em CD, sob chancela Vivarte, Ludwig van Beethoven [1770-1827]: Música de Câmara por L’Archibudelli, Mozzafiato, Jos van Immerseel, Anner Bylsma, Vera Beths e Charles Neidich.
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quarta-feira, dezembro 27, 2017

IMAGINÁRiO #429

José de Matos-Cruz | 01 Agosto 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

SILÊNCIO
Nunca o cinema foi silencioso, mesmo durante o período mudo. E, no entanto, em nenhum espectáculo se tornaria o silêncio tão sugestivo e apelativo, em presenças ou ausências. Na primeira década do Século XX, a música funcionou como um complemento mecânico, ou um aleatório acompanhamento, manifesto durante as sessões públicas. Para os actores, através de uma mera colagem ao ecrã das imagens animadas, literalmente ilustrativa, a representação implicava, sobretudo, uma improvisação. Considerando, no entanto, códigos e significados primários, a transmitir ao público - como o êxtase, o riso, o medo, uma ameaça - a que os acordes melódicos conferiam expressão alusiva. Quando o cinema adquiriu consistência como entretenimento, era através dos seus arquétipos, formalismos ou convenções que se acentuava a acção ou emocionavam as pessoas. The Lodger (1926) de Alfred Hitchcock é considerado o filme mais ruidoso de todo o mudo. A imagem torna-se tão impressionante que, de certo modo, faz estalar a tela silenciosa. Hitchcok recorreria, com talento e frequência, ao que definiu como «o som da agonia», sendo Os Pássaros / The Birds (1963) um exemplo primordial. Por fim, quando as aves predominam, até onde a vista alcança, o silêncio reina - não «um silêncio qualquer, mas um silêncio de uma tal monotonia, que pudesse evocar o ruído do mar, sempre que se ouve muito ao longe».

CALENDÁRiO

03AGO2012 - A revista inglesa Sight and Sound, do British Film Institute, elege A Mulher Que Viveu Duas Vezes / Vertigo (1958), de Alfred Hitchcock, «o melhor filme de todos os tempos», através de uma sondagem entre 846 críticos e especialistas na área do cinema, tomando por critérios a relevância histórica, o sentido estético e o impacto pessoal.

12SET2012 - Em Lisboa, no Terreiro do Paço, Lisbon Story Center expõe Memórias da Cidade.

1917-27SET2012 - Herbert Charles Angelo Kuchacevich von Schluderbacheru, aliás Herbert Lom: Actor inglês de origem austro-húngara, personificou o Comissário Charles Dreyfus na série A Pantera Cor-de-Rosa (a partir de 1964), sendo protagonista Peter Sellers - «Ele era uma pessoa magnífica, mas muito cruel com as crianças. Comigo, acontece o contrário. São os meus filhos que me tratam mal» (2004).

27SET2012 - ZON Audiovisuais estreia Dredd de Pete Travis; com Karl Urban e Lena Headey, transposição da saga em quadradinhos Judge Dredd (1977) de John Wagner & Carlos Ezquerra.
28SET2012 - Aos 71 anos, Augusto Cid assina o seu último cartoon no semanário Sol, pondo fim a uma carreira com quatro decénios de colaboração na imprensa, para dedicar-se por inteiro à escultura. IMAG.45-197-252-279-292

28SET2012 - No Crato, Mosteiro de Santa Maria da Flor da Rosa apresenta Deus e os Demónios - O Fantástico e o Misterioso Na Escultura Românica Em Portugal, exposição de fotografia de Adalrich Malzbender.

12OUT-30DEZ2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I apresenta, com Embaixada da República da Polónia e Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Cascais, A Metáfora No Cartaz e No Desenho de Marian Nowinski.

26OUT-11NOV2012 - Na Amadora, decorre 23º Festival Internacional de Banda Desenhada - Amadora Bd 2012, tendo por tema central a Autobiografia.

INVENTÁRiO

A LEI DE DREDD

América, em 2139. Uma sociedade devastada pela violência e a alienação, a degradação e a miséria, a anarquia e a sobrepopulação. Por Ordem Presidencial, o Departamento de Justiça converteu-se em Julgado. Em Mega-City One - urbe com oitocentos milhões de habitantes - Dredd estabelece a lei das ruas, expondo-se como polícia-juíz-exterminador. Patrulheiro montando a mota Lawmaster, vigilante totalitarista e marcialmente armado. Numa vertigem apocalíptica - entre a ordem civil e o paroxismo belicista - debatem-se a insurreição popular, a corrupção criminal e a perversão científica…
A Lei de Dredd / Judge Dredd (EUA - 1995) é uma transposição para o cinema - com realização de Danny Cannon - sobre Judge Dredd (1977), saga em quadradinhos de John Wagner & Carlos Ezquerra, sob chancela Fleetway (GB). De imediato, o culto expandiu-se nos Estados Unidos, por DC Comics. Astro emblemático, intrépido mas monolítico, Sylvester Stallone - ao lado de Diane Lane - converteu-se em ícone ideal para assumir tal anti-herói, de distorcido humor e expiação exacerbada.

TRAJECTÓRiA

O CINEASTA QUE SABIA DEMAIS

Um dos maiores criadores da indústria cinematográfica anglo-americana, Alfred Joseph Hitchcock faleceu em Los Angeles, a 20 de Abril de 1980. Artista controverso, é unanimemente considerado o mestre do suspense - um dos raros realizadores que o público reconhece, como a personificação de um estilo. Nascido em Londres, a 13 de Agosto de 1899, descendente de uma família burguesa, e tendo rígida formação católica, Hitchcock - cedo fascinado pelo animatógrafo - iniciou-se em 1920, a partir da base: desenhando intertítulos para filmes mudos. Dois anos depois, dirigiu Number Thirteen (inacabado) e, em 1929, o primeiro filme sonoro britânico: Blackmail. Tendo partido, pouco antes da II Grande Guerra, para Hollywood, Hitchcock privilegiava o elemento visual. Era hábil em todas as fases da feitura - do argumento à fotografia, da direcção de actores à montagem, da comercialização ao lançamento publicitário. Caracterizando-se pela busca incessante de novos meios de expressão, pela constante renovação técnica e artística, que adaptava à sua peculiar criatividade, a partir de 1953 passou a usar a cor. Entre os seus tópicos de referência, sobressaem a dialéctica entre aparência e realidade, a atmosfera de culpa, o terror psicológico, a sofisticação da intriga, uma identidade ambígua, a angústia perversa, o artificialismo mórbido, o humor sarcástico.

COMENTÁRiO

François Truffaut: …Volto um pouco atrás na conversa, porque o senhor ia dizer qualquer coisa sobre o realismo do enquadramento, e o estado de espírito no plateau... Eu interrompi-o...
Alfred Hitchcock: Ah, sim! Estou de acordo consigo: muitos cineastas preocupam-se com o plateau no seu conjunto, e a atmosfera de rodagem; no entanto, só deveriam ter uma ideia em consideração: o que aparecerá na tela. Como você sabe, eu nunca olho pelo visor, mas o operador de imagem sabe muito bem que não quero espaço em redor das personagens, e que lhe compete reproduzir fielmente os desenhos que levamos preparados. Nunca nos devemos impressionar com o espaço que a câmara é capaz de captar, pois o principal é sabermos que, para obter a imagem final, podemos pegar numa tesoura e cortar o que está a mais, o espaço inútil. Outro aspecto ligado a esta questão, é que convém não malbaratar esse espaço, pois poderemos, sempre, servir-nos dele em termos dramáticos. Por exemplo, em The Birds, quando os pássaros atacam a casa protegida, e Melanie se lança para trás de um sofá, eu mantive a câmara bastante longe dela e servi-me do espaço para sugerir o vazio, o nada perante o qual ela assim recua. Depois, introduzi uma variante, quando virei a câmara para ela, mas colocando-a bastante alta, para dar a sensação de angústia em crescendo. E, por último, há um terceiro movimento, que consta do seguinte: para cima, e em redor. Mas, o importante era o grande espaço do princípio. Se tivesse filmado, logo de início, junto da rapariga, dar-se-ia a impressão de que ela estava a retroceder ante um perigo que estaria a ver, mas oculto ao público. Porém, eu pretendia mostrar que recuava por força de um perigo que não existia, e, daí, o recurso a todo esse espaço diante dela. Pois bem, os realizadores cujo trabalho consiste, simplesmente, em posicionar os actores diante do cenário, e que colocam a câmara a uma distância maior ou menor, consoante as personagens estão sentadas, de pé ou deitadas, o que eles fazem é confundir as ideias, e o seu trabalho nunca é explícito, pois não significa nada.
François Truffaut
- O Cinema de Alfred Hitchcock

PARLATÓRiO

A propósito da relação entre música e cinema, creio que a mesma suscita casamentos muitas vezes fracassados - mas, quando resultam, tornam-se mágicos. Mágicos, porque significam o encontro de dois meios de expressão muito concomitantes, embora pudessem considerar-se extraordinariamente diferentes: a música parece ser um meio abstracto, etéreo, enquanto o cinema se diria, pelo contrário, concreto e realista, o que não é verdade. Trata-se de um falso realismo absoluto, o último aspecto do efeito do real, mas não certamente de realismo. Pouco a pouco, reflectindo, eu, que cheguei ao cinema através da música, apercebi-me de que estas duas artes se exprimem pela duração: há, efectivamente, uma duração obrigatória; escutamos um bloco de música do princípio ao fim, não paramos a meio. Tal como é normal não se ficar a meio, no visionamento de um filme. Enquanto artes ligadas à duração, utilizam antes de mais o ritmo. Eu faço filmes com argumentos, com teses, com personagens, mas não são mais que pretextos: a finalidade é completamente impalpável, pois ela concretiza-se ao longo do plano. Basta ter um plano da actriz que dure um pouco mais, e toda a temática se altera. Para lograr a fusão música-imagem, é necessária uma conjunção evidente; mas dificilmente esta se consegue.

MEMÓRiA

01AGO1933-2009 - Dom DeLuise: Actor americano - «Um grande homem, em todos os aspectos. Era grande em tamanho e, como actor, gerava grande alegria e grandes gargalhadas» (Mel Brooks). IMAG.249

07AGO1943-2010 - Alain Corneau: Cineasta francês - «Até agora, nunca comecei um filme sem ter a ideia precisa de uma música pré-existente, ou de um músico com quem falei previamente. Mesmo tratando-se de uma banda sonora original, preocupei-me sempre em ter a música antes, com a possibilidade de a transformar mais tarde». IMAG.323

BREVIÁRiO

Universal edita em DVD, Os Pássaros / The Birds (1963) de Alfred Hitchcock; com Rod Taylor e Tippi Hedren.
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Estampa edita D. Manuel II e D. Amélia - Cartas Inéditas do Exílio de Fernando Amaro Monteiro.

Antígona edita Religião, República, Educação - Antologia de Tomás da Fonseca (1877-1968). IMAG.122 -292-303