PRONTUÁRiO
REVELAÇÕES
Dando
continuidade à revelação de edições bizarras e fascinantes, que
ficaram esquecidas ou ocultas dos leitores, a Apenas Livros lançou,
em 1999, Lisboa
No Ano Três Mil - Revelações Arqueológicas, Obtidas Pela Hipnose
e Publicadas Em 1892 por
Cândido de Figueiredo. Apresentada como «uma obra de crítica
social e institucional», apesar dos seus (supostos) cento e tal
anos, em luxuriante prospecção, esta prosa de nomes trocados e
saborosa fantasia permite, virtualmente decifrada na realidade e
adaptada à actualidade, ouvir «a gargalhada casquinar pelas novas
vielas do nosso áureo provincianismo. Pelas suas entrelinhas são
perceptíveis frequentes alfinetadas a alguns vultos do pensamento
português da época, como Eça, Camilo, Antero, Gomes Leal… e
moques e remoques às andanças republicanas». Outro aspecto
estimulante é (re)descobrir a subtil ironia e imaginação mordaz do
seu autor. António Cândido de Figueiredo (1846-1925) foi um dos
fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa, e é geralmente
conhecido pelo Dicionário
da Língua Portuguesa,
«ainda que nos tenha deixado também inúmeros outros estudos de
linguística».
MEMÓRiA
30JUL1894-1990
- Francine Germaine Van Gool Benoït, aliás Francine Benoit:
Compositora e musicóloga, nascida em França e naturalizada
portuguesa (1929) - «Foi professora, pedagoga, compositora,
conferencista, crítica musical e cronista, reconhecida pelos seus
pares pelo seu carácter e singularidade» (Ana Sofia Vieira).
08AGO1694-1746
- Francis Hutcheson: Teólogo, filósofo e escritor irlandês - autor
de Ensaio Sobre a Natureza e
Conduta das Paixões e Afeições
e de Ilustrações Sobre o
Senso Moral.
08AGO1874-1966
- Arthur Justin Léon Leclère, aliás Tristan Klingsor: Poeta,
músico e pintor francês - «Ásia / Ásia, Ásia, Ásia / Terra
maravilhosa de velhos contos / Em que a fantasia dorme como uma /
Imperatriz / Em sua floresta / Cheia de mistério / Ásia, eu queria
partir no barco / Atracado esta noite no porto / Misterioso e
solitário / E que abre enfim suas velas / Violáceas».
09AGO1914-2012
- Maria da Silva Pires Keil do Amaral, aliás Maria Keil: Pintora e
ilustradora portuguesa, casada com Francisco Keil do Amaral,
distinguida com o Grande Prémio Aquisição pela Academia Nacional
de Belas-Artes (2009) - «Tornei-me artista plástica… porque
calhou!». IMAG.13-150-244-393-413-472
1905-14AGO1994
- Elias Canetti: Escritor búlgaro, Prémio Nobel da Literatura em
1981 - «Toda a palavra pronunciada é falsa. Toda a palavra escrita
é falsa. Toda a palavra é falsa. Mas o que existe, sem palavras?»
(A Província do Homem -
1973). IMAG.388
CALENDÁRiO
1922-08AGO2013
- Regina Resnik: Cantora lírica americana, mezzo-soprano
de ascendência ucraniana - «Nasci com o dom de ter uma garganta
muito forte».
22AGO2013
- O Som e a Fúria estreia Até
Ver a Luz com Euclides Mendes
Fernandes e José Zeferino da Cruz; Nuvem
com Nelson Duarte e Pedro
Diniz; e Os Vivos Também
Choram com José Pedro Gomes
e Dorin Dragos, filmes de Basil da Cunha.
VISTORiA
A
Flauta Mágica
A
sombra está suave e meu senhor
Está dormindo
Em sua cabeça traz um gorro de seda
Em forma de cone
E seu comprido nariz amarelo
Em sua barba branca
Eu, porém, estou acordada ainda
E ouço lá fora
Um som de flauta em que transparecem,
Alternadamente, a tristeza e alegria,
Uma melodia ora lânguida, ora banal
Que meu bem-amado vai tocando
E quando chego perto da janela,
Me parece que cada nota voa
Da flauta até meu rosto
Como um beijo misterioso
Está dormindo
Em sua cabeça traz um gorro de seda
Em forma de cone
E seu comprido nariz amarelo
Em sua barba branca
Eu, porém, estou acordada ainda
E ouço lá fora
Um som de flauta em que transparecem,
Alternadamente, a tristeza e alegria,
Uma melodia ora lânguida, ora banal
Que meu bem-amado vai tocando
E quando chego perto da janela,
Me parece que cada nota voa
Da flauta até meu rosto
Como um beijo misterioso
Tristan
Klingsor
-
Shéhérazade
(excerto - Tradução de Maria Sylvia Nunes)
VISTORiA
Carta
III –
A Ponte Monumental

São
restos de grandes pilares de ferro, meio carcomidos pelo tempo e
pelos óxidos salinos. Folheando memórias seculares, cheguei à
conclusão de que estes pilares sustentaram, há dez séculos, uma
grande ponte que ligava as duas margens do Tejo.
É
difícil verificar hoje a quem pertenceu a iniciativa daquela
construção, realmente notável. As relações e monografias coevas
falam vagamente de um construtor nacional, Pais,
como sendo o primeiro que forneceu um plano exequível para a famosa
ponte. Parece no entanto averiguado que os Portugueses não
acreditaram jamais que santos da casa fizessem milagres, e que
aceitaram o primeiro ou o segundo plano que apareceu firmado por um
ou mais nomes estrangeiros.
Timbravam
de patriotas os Portugueses, mas tinham uma adoração fetichista por
tudo o que lhes viesse de fora, desde os toiros e cantores de opereta
até aos trajes de gala e aos planos de construções nacionais…
Cândido
de Figueiredo
-
Lisboa No Ano Três Mil
-
Revelações Arqueológicas, Obtidas Pela Hipnose e Publicadas Em
1892 (excerto)

Eu
entrara, entretanto, e esforçava-me por desvendar como ocupavam o
tempo aquelas inúmeras crianças. As mais pequenas brincavam no
chão. Entre elas encontrava-se um professor, pobremente vestido; na
mão direita segurava um cinto em coiro, um cinto para bater, para
castigar! Aproximou-se de ar submisso. O seu rosto longo era regular
e sem expressão, e o olhar mortiço contrastava com toda aquela
vivacidade das crianças. Parecia não só nunca poder vir a ser o
seu mestre, como até mal pago. Era um homem novo. A sua juventude,
porém, tornava-o paradoxalmente mais velho. Não falava nem uma
palavra de francês, e eu nada esperava dele. Sentia-me satisfeito
por ali estar no meio daquele barulho ensurdecedor e por poder olhar
em roda. Mas tinha-o avaliado mal. Atrás do seu olhar mortiço,
escondia-se algo como a ambição. Queria mostrar-me o que os seus
meninos sabiam. Chamou um rapazito, abriu-lhe a cartilha debaixo dos
olhos, de tal forma que também eu podia ver o texto, e apontava
rapidamente ora para uma ora para outra sílaba hebraica. Mudava de
linha em todas as direcções. Era preciso que eu não pensasse que o
rapaz sabia tudo de cor e que estava a recitar, cegamente, sem ler.
Os olhos de garoto faiscavam, enquanto lia em voz alta:
«La-lo-manusche-ti-ba-bu».
Elias
Canetti
-
As Vozes de Marraquexe
(1968 - excerto)
BREVIÁRiO
Universal
edita em CD, Abraçaço de
Caetano Veloso. IMAG.166-180
Esfera
dos Livros edita Grandes
Naufrágios Portugueses 1194-1991 de
José António Rodrigues Pereira.
ECM
Records edita em CD, Concert
In Athens por Eleni
Karaindru.
Estampa
edita Ruben A. - Uma Biografia
de Liberto Cruz e Madalena
Carretero Cruz; na colecção Memória das Letras, sobre o escritor
Ruben Andresen Leitão (1920-1975). IMAG.52
-406
Saída
de Emergência edita Lisboa No
Ano 2000, com coordenação
de João Barreiros.
ANUÁRiO
1842-1914
- Ambrose Gwinnett
Bierce: Editor, escritor e
jornalista americano, de cariz satírico - «Em questões
internacionais, a paz é um momento de trapaça entre dois períodos
de combate. IMAG.376
ELUCIDÁRiO
Paciência
- s. Forma menor de desespero, disfarçada de virtude.
Pagão
- s. Ser transviado que
incorre na loucura de adorar o que pode ver e sentir.
Palácio
- s. Residência bela e cara, particularmente a de um grande
funcionário. A residência de um alto dignitário da Igreja chama-se
palácio; à do fundador da sua religião chama-se palheiro ou
casebre. O progresso existe.
Paus
de incenso - s. Pauzinhos que
os chineses queimam, no exercício das suas palhaçadas pagãs,
imitando certos ritos sagrados da nossa santa religião.
Ambrose
Bierce
-
O Dicionário do Diabo (1906-1911
- excerto)
EXTRAORDINÁRiO
OS
HUMANIMAIS - Folhetim Aperiódico
CARTA
NA MÃO DOBRA O ENGUIÇO
- 2
Até
mesmo antes de criança mal gerada e assustando Lisboa, fora um feto
infecto – como a peste a chegar a estes tempos, desde que se
lançavam cadáveres virulentos ou pessoas contaminadas para dentro
das cidades sitiadas. Ora, ninguém capaz escapará a tal calamidade.
Há,
portanto, perigos que inebriam a vertigem entre a liberdade e o
calabouço. A rotina de Salomão fazia-se de tal fortuito enleio, um
estímulo que o destrambelhava sem qualquer motivação ou
transcendência.
– Continua
Sem comentários:
Enviar um comentário