segunda-feira, janeiro 22, 2018

IMAGINÁRiO #445

José de Matos-Cruz | 01 Dezembro 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

REGRESSÕES
Se o futuro é um destino admirável, na expectativa de viagens no tempo, a probabilidade das incursões no passado reveste-se, aparentemente, de insuspeitáveis aliciantes - malgrado o preceito convencional, entre os potenciais exploradores, de não se provocar qualquer feito que possa afectar a posteridade, de uma forma irreversível... Eis os fundamentos e desígnios da saga Regresso ao Futuro /Back To the Future (1985-1989-1990), realizada numa trepidante trilogia por Robert Zemeckis. Refugiado trinta anos atrás, em virtude de uma ameaça vital, o protagonista concretizaria, na aventura inaugural, o excepcional privilégio de relacionar-se com os pais auspiciosos, numa altura em que encetam o ritual de namoro. Apesar do seu escrúpulo em não alterar o devir histórico, e pesem embora as significativas correcções que virão a reflectir-se, não nos escapa a insolência com que Marty McFly constata o comportamento dos (que serão seus) progenitores, em contraste com os conselhos que depois puderam dar-lhe!

MEMÓRiA

01DEZ1923-2001 - Maurice de Bevère, aliás Morris: Autor belga de quadradinhos, criador de Lucky Luke - «Um herói que atrai sucessivas gerações... Parece incrível! É esse o privilégio da banda desenhada, sobretudo de carácter popular: o interesse continua, para sempre»».
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106 aC-07DEZ43 aC - Cícero, aliás Marcus Tullius Cicero: Filósofo, escritor e orador romano - «O que mais nos ajuda a conservar e manter a nossa força é o facto de sermos amados; e o que se lhe opõe mais é o facto de termos medo. O medo é mau guarda da nossa longevidade; a benevolência, pelo contrário, é fiel e dura até à eternidade (Dos Termos Extremos ao Bem e do Mal).

1940-04DEZ1993 - Frank Zappa: Compositor e guitarrista americano - «As coisas funcionam assim: escolhe-se uma melodia, seja ela qual for, Beethoven ou música havaiana, tocamo-la à guitarra, adicionamos o baixo e a bateria, e as pessoas dirão que é rock´n roll». IMAG.303

06DEZ1933-2010 - Henryk Górecki: Compositor polaco, distinguido com a Ordem da Águia Branca - «Aos jovens criadores: se conseguirem viver sem escrever música durante dois ou três dias, então aproveitem - é melhor passarem o vosso tempo com uma rapariga ou uma cerveja». IMAG.331

CALENDÁRiO

1926-11DEZ2012 - Galina Vishnevskaya: Soprano russa, casada com o maestro e violoncelista Mstilav Rostropovitch, estrela da ópera da União Soviética, e exilada em 1974 - «O seu legado artístico e pessoal vai durar infinitamente mais do que tudo o que lhe perturbou a existência» (The Telegraph).

28FEV1923-24DEZ2012 - Charles Durning: Actor americano de cinema, teatro e televisão - «Começar a dançar, foi muito fácil para mim… Iniciar-me na representação, tornou-se muito difícil».

1935-29DEZ2012 - Paulo Rocha: Cineasta português - «Ele abriu as portas, o olhar, o modo como nos olhamos e registamos em imagens em movimento, o que somos, o que sonhamos ser, e o que queremos ser. Ficamos seguramente mais pobres, menos iluminados, com menos luz à nossa volta» (Maria João Seixas). IMAG.4-31-87-180

19FEV-30ABR2013 - Nos Cursos Livres da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, organizados pelo Departamento de Ciências da Comunicação, Maria do Carmo Piçarra lecciona Noite Portuguesa - A Propaganda No Cinema do Estado Novo. Contacto: nflv@fcsh.unl.pt

INVENTÁRiO

REGRESSO AO FUTURO - TRILOGIA
Em Regresso ao Futuro (1985) de Robert Zemeckis, a insólita cumplicidade entre pais e filho - que se estabelece com o público - era um dos mais insinuantes atractivos no argumento de Bob Gale & Zemeckis, tendo estimulado o retomar da saga - através do tempo e da projecção fílmica... Investindo em ambos, Zemeckis - o mais hábil dos realizadores patronizados por Steven Spielberg - lançou-se, uma vez concluído Quem Tramou Rober Rabbit (1988), na produção sucessiva das Partes II (1989) e III (1990), sempre em aliança essencial com Gale.
Personagem mobilizadora, transferencial de tais prodígios, o cientista Doc Emmet Brown volta ao presente de 1985 - com o seu espantoso carro DeLorean, capaz de bater todas as barreiras em máxima aceleração - para alertar Marty de que um filho corre perigo, no Século XXI. Voando para lá, no sensacional veículo - entretanto aperfeiçoado por Doc, em devoção aos desafios tecnológicos.
Ainda na Parte II, os desvios ao efeito cronológico levam Doc e Marty a recuarem de 2015 a outro 1985 e a 1955 - revelando que, se tais viagens não influem na idade física dos incursionistas, suscitam porém tantos entes temporais quantas as exposições a uma mesma realidade. Tudo se complica pois, nesta lógica fabulosa que - afinal - se transcende sempre em risco de perturbações evolutivas, por um apelo a alcances cada vez mais remotos...
É assim que, em Parte III, o Marty da II procura, prisioneiro em 1955, o Doc da Parte I, para que este lhe dê meios - a fim de o libertar a ele próprio, Doc da Parte II, acidentalmente projectado e circunscrito em 1885! Sempre graças ao DeLorean, e tendo como referência espacial a praça pública de Hill Valley, em cujo torreão sobranceará um grande relógio - que, funcionando ou não, é mesmo decisivo para tais deslocações.
Se a Parte I de Regresso ao Futuro encantava pelo tema insólito, e na II se engenhou uma vertiginosa interacção, a Parte III cumula uma ironia sobre o imaginário, fecundo e fluente, com uma expressiva homenagem às tradições do western. Marty é o jovem herói que, sobretudo, se resgata a ele-próprio - consubstanciando a coragem dos pioneiros, dando elã à linhagem familiar.
Com a indumentária e um irreverente nome de Clint Eastwood, Marty sagra a memória e os mitos do cinema - mas competirá a Doc decidir um destino pessoal: fiel à estima e solidariedade entre ambos, acaba por afirmar-se - afectivamente - junto da mulher amada, e que lhe dará filhos. Sagrando ainda o extraordinário ensejo de um reencontro - para além dos limites virtuais, constantes porém num epílogo linear, ao irradiar as coordenadas da aventura humana!

OS VERDES ANOS - UMA GERAÇÃO NA FATALIDADE
Genuíno testemunho, em que convergiriam as expectativas do cinema novo, Os Verdes Anos (1963) revelou gente jovem, aliás «sem passado e sem responsabilidades na produção nacional, e que tem uma visão universal, que lhe advém do longo contacto com os estúdios parisienses». O realizador Paulo Rocha diplomara-se pelo IDHEC, em França, tal como o produtor António da Cunha Telles. Nuno Bragança adaptou o argumento de Rocha, elaborando os diálogos. A psicologia das personagens insinua-se no elo realista dos seus conflitos e tensões, reflectindo a crise social através da singularidade poética. Isabel Ruth e Rui Gomes são os nóveis protagonistas duma época virtual, em suas referências testemunhadoras. Inquietação, sensibilidade pairam neste retrato de geração - entre a alienação e a rebeldia. É a idade duma inocência perdida, pervertida nos paradoxos do tempo e do envolvimento. Aos dilemas convencionais, como o desenraizamento ou a inadaptação, corresponde uma obsessão funesta, precipitando a catástrofe. Amor, ciúme, virilidade, frustração. Uma síntese radical - ética e estética. A música de Carlos Paredes constitui um sugestivo elemento dramático. As filmagens decorreram em interiores e locais autênticos. Luc Mirot desvenda uma outra Lisboa - segundo Rocha, fixando «bocados da Avenida dos Estados Unidos, as colinas cobertas de oliveiras que dominam a zona nova e o rio, os descampados à volta da cidade universitária». De resto, tudo está patente: gente humilde, destino fatal… Com orçamento de 900 contos, Os Verdes Anos estreou no São Luiz e Alvalade, em Novembro de 1963. Símbolo de denúncia, sinal de diferença, foi distinguido com a Vela de Prata/Opera Prima em Locarno (1964), a Cabeza de Palenque em Acapulco e uma Menção Honrosa em Valladolid (1965).

ANUÁRiO

1863 - Neste ano, o produto dos telegramas nos Telégrafos de Lisboa foi de 46:509$620 réis.

BREVIÁRiO

Universal edita em Blu-ray, Regresso ao Futuro /Back To the Future Trilogy (1985-1989-1990) de Robert Zemeckis; com Michael J. Fox e Christopher Lloyd. IMAG.59-246

Quetzal edita Odes de Píndaro (518 aC-438 aC); tradução de António de Castro Caeiro. IMAG.161-307-324

Universal edita em CD, sob chancela Decca, Agostino Steffani [1654-1728]: Mission por Cecilia Bartoli e Philippe Jarousski, com I Barocchisti, sob a direcção de Diego Fasolis.

Relógio D’Água edita 50 Poemas de Tomas Tranströmer; tradução de Alexandre Pastor. IMAG.379

Bizâncio edita Os Cinemas de Lisboa - Um Fenómeno Urbano do Século XX de Margarida Acciaiuoli.

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS - Folhetim Aperiódico

COMO GUARDAR O CORAÇÃO NA CAIXINHA DAS ESMOLAS - 6

Um olhar paralisado firmou a cumplicidade entre o casal de velhos.
Ambos esbracejavam, parvos, na eminência da tragédia, sob o naufrágio da santidade. Eram carrascos de uma oportunidade rara e desvairada, naquela estalagem erma, desolada, do Minho bravio, em que se cruzava, sem destino, o paradoxo de quatro caminhos. Até que tudo parecia ter um fim.
Continua
 

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