PRONTUÁRiO
HERANÇAS
No
culto privilegiado da escola franco-belga, entre nós, Spirou
e Fantásio
formam uma das mais populares duplas aventurescas - sagrando um
clássico cujos impacto e modernidade se mantêm, ao longo de
décadas, conquistando os leitores adolescentes. Para tal, Franquin
converteu-se em referência essencial - mas, numa alusão festiva, é
preciso recuar no tempo e no culto, até às origens, com o criador
Rob-Vel. E melhor oportunidade não poderia haver: o irresistível
Spirou - que em valão significa esquilo ou, alegoricamente,
irrequieto, tendo sido baptizado pelo escritor Émile-André Robert -
celebra em 2013 setenta e cinco anos, desde que foi admitido como
groom
no Moustic-Hôtel! Por esse mesmo e já distante 1938, apareceu Le
Journal de Spirou
- prestigiando-se com atracções e aliciantes que fizeram o estilo
de uma revista, através de sucessivas gerações… Entretanto, e
sublimando heranças artísticas sob chancela Asa, Nas
Origens do Z -
por Morvan, Yann e Munuera - volta ao passado de Zorglub, Conde de
Champignac, para preservar o presente e expandir a irreverência
exuberante, estilizada caricaturalmente, das aventuras de Spirou
e Fantasio -
símbolo da imprensa juvenil em banda desenhada…
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VISTORiA
Não
fugir. Suster o peso da hora
Sem palavras minhas e sem os sonhos,
Fáceis, e sem as outras falsidades.
Numa espécie de morte mais terrível
Ser de mim todo despojado, ser
Abandonado aos pés como um vestido.
Sem pressa atravessar a asfixia.
Não vergar. Suster o peso da hora
Até soltar sua canção intacta.
Sem palavras minhas e sem os sonhos,
Fáceis, e sem as outras falsidades.
Numa espécie de morte mais terrível
Ser de mim todo despojado, ser
Abandonado aos pés como um vestido.
Sem pressa atravessar a asfixia.
Não vergar. Suster o peso da hora
Até soltar sua canção intacta.
Cristovam
Pavia
A
Poesia
Aproveitei-me,
confesso, de certos acidentes
Do mistério e de erros de cálculos celestes.
Aí está toda a minha poesia: eu decalco
O invisível (o que para vós é invisível).
Ao crime disfarçado em trajo desumano,
«Mãos ao ar!», gritei eu, «É inútil reagir»;
A encantos informes tratei de dar contorno;
Das astúcias da morte a traição informou-me;
Com tinta azul fiz aparecer, de súbito,
Fantasmas transformados em árvores azuis.
Será louco dizer que é simples ou sem perigo
Empresa semelhante. Incomodar os anjos!
Descobrir o acaso em flagrante delito
De batota, e as estátuas a tentarem andar!
Por cima de cidades que pareciam desertas,
Nos mirantes aonde somente chega a voz
Dos galos, das escolas, buzinas de automóveis
(Os únicos ruídos que das cidades sobem),
Surpreendi, provindos dos subúrbios do céu,
Assombrosos rumores, gritos de outra Marselha.
Do mistério e de erros de cálculos celestes.
Aí está toda a minha poesia: eu decalco
O invisível (o que para vós é invisível).
Ao crime disfarçado em trajo desumano,
«Mãos ao ar!», gritei eu, «É inútil reagir»;
A encantos informes tratei de dar contorno;
Das astúcias da morte a traição informou-me;
Com tinta azul fiz aparecer, de súbito,
Fantasmas transformados em árvores azuis.
Será louco dizer que é simples ou sem perigo
Empresa semelhante. Incomodar os anjos!
Descobrir o acaso em flagrante delito
De batota, e as estátuas a tentarem andar!
Por cima de cidades que pareciam desertas,
Nos mirantes aonde somente chega a voz
Dos galos, das escolas, buzinas de automóveis
(Os únicos ruídos que das cidades sobem),
Surpreendi, provindos dos subúrbios do céu,
Assombrosos rumores, gritos de outra Marselha.
Jean
Cocteau
-
Par Lui-Même
(1927 - Tradução de David Mourão-Ferreira)
CALENDÁRiO
1929-23NOV2012
- José Luis Borau: Cineasta espanhol, argumentista e realizador
(Furtivos
- 1975), presidente da Academia das Artes e das Ciências
Cinematográficas (1994-1999) e membro da Real Academia Espanhola
(2008) - «Fazemos filmes, como fazemos amor - o melhor que podemos».
01DEZ2012-30MAR2013
- Em Lisboa, Museu Nacional de Arte Antiga expôs A
Arquitectura Imaginária -
com cerca de 150 obras, do Século XIV aos nossos dias, que propõem
um ângulo novo de aproximação à pintura, à escultura, à
ourivesaria e às artes decorativas, sendo comissários António
Filipe Pimentel e Joaquim Oliveira Caetano.
VISTORiA
Moça
Linda e Bem Tratada
Moça
linda bem tratada,
Três séculos de família,
Burra como uma porta:
Um amor.
Três séculos de família,
Burra como uma porta:
Um amor.
Grã-fino
do despudor,
Esporte, ignorância e sexo,
Burro como uma porta:
Um coió.
Esporte, ignorância e sexo,
Burro como uma porta:
Um coió.
Mulher
gordaça, filó,
De ouro por todos os poros
Burra como uma porta:
Paciência...
De ouro por todos os poros
Burra como uma porta:
Paciência...
Plutocrata
sem consciência,
Nada porta, terremoto
Que a porta de pobre arromba:
Uma bomba.
Nada porta, terremoto
Que a porta de pobre arromba:
Uma bomba.
Mário
de Andrade
COMENTÁRiO
A
poesia de Cristovam Pavia é a revelação de si próprio, de uma
personalidade em conflito com o mundo em que vive e que procura uma
fuga pela recuperação da infância morta, pela aceitação do seu
conhecer-se diferente e despojado do que lhe é mais caro (a
infância, o amor, o espaço e o tempo em que ambos se situavam), a
transformação do seu próprio ser pelo sofrimento, num movimento de
ascese e de autodestruição, quando o poeta atinge a consciência de
si próprio e da sua voz.
José
Bento
-
Sobre a Poesia de Cristovam
Pavia (1982)
MEMÓRiA
07OUT1933-1968
- Francisco António Lahmeyer Flores Bugalho, aliás Cristovam Pavia:
Poeta português - «Ó Lisboa ó Lisboa enjoada e indecente / Ó
cidade sifilítica, são carochas ou gente? / Ó Rua dos Fanqueiros /
Ó Portugal minha pátria de meia-tigela/ - Aqui para nós, passa-se
tão bem sem ela!» (Litania
da Rua dos Fanqueiros -
excerto). IMAG.165-339-345
09OUT1893-1945
- Mário Raul de Morais Andrade, aliás Mário de Andrade: Escritor
brasileiro, historiador e musicólogo - «Escrevo sem pensar, tudo o
que o meu inconsciente grita. Penso depois: não só para corrigir,
mas para justificar o que escrevi».
10OUT1813-1901
- Giuseppe Fortunino Francesco Verdi, aliás Giuseppe Verdi:
Compositor italiano - «É um erro escrevermos óperas longas,
intermináveis, para durarem todo um serão. Há que compor, apenas,
óperas com um ou dois actos, sem uma pompa absurda - impõe-se esta
reforma». IMAG.72-89-156-188-203-308-314-318-328-420

1889-11OUT1963
- Jean Maurice Eugène Clément Cocteau, aliás Jean Cocteau: Poeta e
ficcionista francês, dramaturgo e artista plástico - «O futuro não
pertence a ninguém. Não há precursores, apenas existem
retardatários». IMAG.212-264-326-388
COROLÁRiO
Província
de Sergipe
O
adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel
Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant’Ana quando a
mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado
cabra que estava de em uma moita de mato, sahiu della de supetão e
fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se
pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra
abrafolou-se dela, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de
fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimonio porque ella
gritou e veio em amparo della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que
prenderam o cujo em flagrante. Dizem as leises que duas testemunhas
que assistam a qualquer naufrágio do sucesso faz prova.
Considero:
que o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para
conxambrar com ela e fazer chumbregâncias, coisas que só marido
della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja
Cathólica Romana; que o cabra Manoel Duda é um suplicante deboxado
que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que
quiz também fazer conxambranas com a Quitéria e Clarinha, moças
donzellas; que Manoel Duda é um sujeito perigoso e que não tiver
uma cousa que atenue a perigança dele, amanhan está metendo medo
até nos homens.
Condeno:
o cabra Manoel Duda, pelo malifício que fez à mulher do Xico Bento,
a ser capado, capadura que deverá ser feita a macete. A
execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta Villa.
Nomeio
carrasco o carcereiro.
Cumpra-se
e apregue-se editais nos lugares públicos.
Manoel
Fernandes dos Santos
Juiz
de Direito da Vila de Porto da Folha Sergipe, 15 de Outubro de 1833
Instituto
Histórico de Alagoas - Brasil
BREVIÁRiO
Editorial
Caminho edita Dicionário do
Cinema Português 1895-1961 de
Jorge Leitão Ramos.
IMAG.6-76-102-125-161-170-225-289-331-402-419-433
Dom
Quixote edita O Som e a Fúria
de William Faulkner
(1897-1972); tradução de Ana Maria Chaves, prefácio de António
Lobo Antunes
IMAG.86-153-231-232-305-340-356-377
ECM
edita em CD, Claude Debussy
[1862-1918] - Préludes
pelo pianista Alexei Lubimov.
IMAG.252-291-301-349-375-383
EXTRAORDINÁRiO
OS
SOBRENATURAIS - Folhetim Aperiódico
COMO
GUARDAR O CORAÇÃO NA CAIXINHA DAS ESMOLAS -
5
- Tu
ouviste como as moedas tilintaram, quando a saca de couro lhe escapou
das mãos, e caiu para o soalho...
justificou-se Cândido, em vão, com uma convicção já vencida pela
cobiça.
– Continua
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