domingo, outubro 08, 2017

IMAGINÁRiO #384

José de Matos-Cruz | 24 Agosto 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

IMPRESSÕES
«Terça-feira, 18 de Outubro - O talento dos autores a que nos dedicamos é uma espécie de adubo que nos faz medrar. Uma pequena notoriedade é ganha à sua custa.» Assim regista Ricardo António Alves em Abencerragem - 1. Do Escritório às Palavras - um tomo referencial, apelativo, reunindo impressões, anotações, excertos de opiniões e testemunhos, coligidos a partir de 2005. A abrir esta edição sob chancela Livros do Estoril, qual diário estruturado por apreços e alusões culturais, fragmentários mas irresistíveis, desvenda o autor: «pareceu-me que não devia deixar para trás os sons e as imagens que me vão acompanhando». E, a páginas tantas: «Terça-feira, 29 de Março - 2 versos de Carlos Drummond de Andrade: “Penetra surdamente no reino das palavras / Lá estão os poemas que esperam ser escritos.”» Todo um universo favorito e crítico, memorial, amplo ou peculiar, de intuições plásticas e literárias, de expressão clássica ou moderna, e até ironia melómana: «Terça-feira, 1 de Novembro - Origens. Se ouvirem o antigo cabeleireiro Chuck Berry, perceberão de onde vêm os Rolling Stones.» . IMAG.26-47-180

CALENDÁRiO

27OUT2011 - O álbum gráfico O Diário de K (2001) de Filipe Abranches, adaptação de A Morte do Palhaço (1926) de Raul Brandão, é inserido no guia 1001 Bandas Desenhadas Para Ler Antes de Morrer de Paul Gravett, com prefácio de Terry Gilliam em edição Universe. IMAG.17-29-66-129-211-244

30OUT2011 - No âmbito do 22º Festival Internacional de Banda Desenhada - Amadora Bd 2011, O Amor Infinito Que Te Tenho e Outras Histórias de Paulo Monteiro - com edição Polvo - é distinguido como Melhor Álbum Português de Banda Desenhada. IMAG.36-149-226

MEMÓRiA

1829-24AGO1912 - Raimundo António de Bulhão Pato: Ficcionista, poeta, ensaísta e memorialista português - «O marquês de Sabugosa e eu tínhamos nossas fumaças de bons andadores. Ufanávamo-nos de, havendo saído de uma reunião em casa do marquês de Penalva, à Patriarcal, de chibatinha na mão - das que então se chamavam polkas - irmos até ao palácio de São Lourenço, a Santo Amaro, e, resolvendo-nos subitamente, sem pregar olho, batermos connosco em Sintra! Contámos, com certo orgulho, a aventura a Alexandre Herculano, quando na volta, que foi também a pé no dia seguinte, lhe caímos em casa sobre a ceia, impando de glória e mortos de fome; porque o nosso dinheiro, naquela viagem, fora meia moeda e quando regressávamos, chegando a Queluz, possuíamos 30 reis, que comprámos de uvas!» (A Cruz Mutilada - excerto). IMAG.57-74-220-252-336

1704-25AGO1742 - José António Carlos de Seixas, aliás Carlos Seixas: Compositor, cravista e organista da corte de D. João V - «Quiz o Sereníssimo Senhor Infante D. António que o grande Escarlate (Domenico Scarlatti), pois se achava em Lisboa no mesmo tempo lhe desse alguma lição, regulando-se por aquela ideia errada de que os portugueses por mais que fação nunca chegarão a fazer o que fazem os Estrangeiros, e o mandou ao dito: este apenas o viu pôr as mãos no cravo, conhecendo o gigante pelo dedo, lhe disse - Vossa mercê é que me pode dar lições, e encontrando-se com aquele Senhor lhe disse - Vª Alteza mandou-me examinar, pois saiba que aquele sujeito é dos maiores professores que eu tenho ouvido» (José Mazza - Século XVIII). IMAG.58-102-227-229

1915-29AGO1982 - Ingrid Bergman: Actriz sueca do cinema internacional - «Eu não tenho arrependimentos. E não teria vivido a minha vida do modo que vivi, se fosse preocupar-me com o que as pessoas iriam comentar». IMAG.48-91-238-288-312-318-377

VISTORiA

A Morte de José António Carlos (Seixas), Famoso Cravista

Por perpétuo silêncio a Parca dura
Do Luso Orféo à doce melodia,
Já se vê os assombros da harmonia
Clauzurados no horror da Sepultura.

Na destreza feliz, na ideia pura
Do impulso humano as forças excedia,
E invejando-lhe a morte a idolatria
Provar-lhe o culto em lágrimas porfia.

Se deve à Pátria o seu merecimento
Glória imortal em vida transitória
Seja igual à jactância hoje o lamento.

Porém de tanta perda na memória,
Aonde irá parar o sentimento
Se serve a pena a proporção da glória.
Colecção de Sonetos sérios que se não acham impressos,
extraídos dos manuscritos antigos e modernos, com data de 1786 (Biblioteca Nacional)

COMENTÁRiO

François Truffaut: No fim de A Casa Encantada/Spellbound (1945), quando a mão do médico sustém a pistola, no eixo da silhueta de Ingrid Bergman?...
Alfred Hitchcock: Sim. Havia uma maneira mais simples de fazer isso. Se inundarmos a cena de luz, pode-se trabalhar com uma abertura pequena. Mas o operador, em Spellbound, não foi capaz de o concretizar. Era um técnico muito conhecido: George Barnes. Eu já tinha trabalhado com ele em Rebecca (1940). Disse-me que não podia fechar o diafragma, porque prejudicaria o rosto de Ingrid Bergman. A verdadeira razão é que ele era, em Hollywood, um fotógrafo de mulheres. Na época das grandes estrelas, quando estas começavam a ficar com algumas rugas, este tipo de operadores punha uma gaze velada, diante da objectiva. Depois, reparou-se que isso era bom para o rosto, mas não para o olhar. Então o operador, com um cigarro, passou a fazer dois furos na gaze, que correspondiam à posição da vista. Assim, o rosto era suave e os olhos cintilavam, mas, evidentemente, elas não podiam mexer a cabeça. Então, passaram do véu de gaze aos filtros difusores. Mas isso colocava, também, um problema. A vedeta dizia ao chefe-operador: «Os meus amigos comentam que estou a envelhecer, que comigo já recorrem à difusão, e isso nota-se, quando inserem grandes planos meus, a meio de uma cena». Então, o chefe-operador respondia: «Vou resolver isso». E era muito simples: decidia criar o mesmo efeito difusor no resto do filme; por isso, quando se procedia à inserção do primeiro plano, já não havia diferença!
François Truffaut
- O Cinema de Alfred Hitchcock

BREVIÁRiO

Teorema edita Na Casa de Honey de Elmore Leonard; tradução de Luís Ruivo Domingos. IMAG.182

Universal edita em CD, sob chancela Decca, Verismo Arias pelo tenor Jonas Kaufmann, com Coro e Orquestra da Academia de Santa Cecilia, sob a direcção de Antonio Papano.

Antígona edita Ondina de Friedrich de La Motte-Fouqué (1777-1843); tradução de Manuela Gomes, prefácio de Teolinda Gersão.

Sony edita em CD, J.S. Bach [1685-1750]: Concertos pelo pianista Murray Perahia. IMAG.32-58-163-198-203-212-216-220-240-248-267-268-269-280-284-305-308-332-334-340-363-375

Quetzal edita Onze Tipos de Solidão de Richard Yates; tradução de Nuno Guerreiro Josué.

Harmonia Mundi edita em CD, Ludwig van Beethoven [1770-1827]: Complete Piano Concertos por Paul Lewis, com Sinfónica da BBC, sob a direcção de Jiri Belohlávek.
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Dom Quixote edita Os Terraços de Junho de Urbano Tavares Rodrigues. IMAG.71-96-157-229

Universal edita em CD, sob chancela Decca, Franz Liszt [1811-1886]: Harmonies du Soir pelo pianista Nelson Freire. IMAG.92-175-319-337

Ática edita Como Organizar Portugal de Fernando Pessoa (1888-1935).  
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VISTORiA

As Folhas Caídas
Um dia Almeida Garrett escreveu uma longa carta a Alexandre Herculano. Nesse papel fazia-se uma confidência amarga! O poeta havia levado mais um revés, dos muitos da sua combatida e aventurosa existência.
Estava num momento análogo àquele, que lhe inspirara numas páginas de prosa, que vêm nas Flores sem Fruto - esta apóstrofe à solidão:
«Solidão, eu te saúdo! Silêncio dos bosques, salve!
A ti venho, ó natureza: abre-me o teu seio.
Venho depor nele o peso aborrecido da existência; venho despir as fadigas da vida.»
Supunha, iludido pela dor, que poderia prescindir do mundo, ele, o mais mundano de todos os artistas; ele, para quem os fastígios do poder, as pompas do luxo, os máximos requintes do gosto; as pérolas, as safiras, as esmeraldas e os diamantes, rutilando no seio, nas mãos, nos cabelos negros retintos, ou loiros acendrados, da mulher apetecida - ou adorada - se tornavam impreteríveis!
Mas, no momento, a sua dor era intensa e sincera; por isso, confirmando o preceito de Horácio, ao descrevê-la a todos nos comovia.
Grandes foram as provações por que passou aquele desmesurado espírito! Para quem o lidou de perto, sobretudo nos últimos tempos, pelos seus versos - Flores sem Fruto e Folhas Caídas - é fácil determinar quais foram as crises, os acessos dolorosos, no drama daquele coração, que teve mais de um afecto, que facilmente se deixava seduzir, mas que tão profunda, tão arrebatadamente se apaixonava!
Depois de grandes desgostos domésticos, que as dicacidades brutais e malévolas de ânimos corrompidos vinham ainda envenenar, o poeta parecia sucumbir aos revezes da má fortuna.
Bulhão Pato

Tarzan dos Macacos
Foi com o Russ Manning que comecei a seguir as aventuras do Tarzan. As historinhas saíam aqui nas publicações toscas da Agência Portuguesa de Revistas, enquanto que a brasileira EBAL anunciava as edições de Burne Hogarth («tudo em cor»), artista que o Vasco Granja me ensinara ser «o Miguel Ângelo das histórias em quadrinhos». Lamento, mas eu gostava muito mais de ler o Russ Manning, com todas aquelas inverosimilhanças - parece que muito fiel ao Burroughs - do que o perfeccionista Hogarth, com os seus correctíssimos estudos anatómicos para atingir uma BD plena de euritmia.
Ricardo António Alves
- Abencerragem - 1. Do Escritório às Palavras - Quarta-feira, 26 de Outubro

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